"Conheças todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana." Jung

sábado, 13 de agosto de 2011

DEPENDÊNCIA QUÍMICA: CALVÁRIO E LIBERTAÇÃO; O SOL NASCERÁ... - Jorge Bichuetti



Parece que é urgente repensar nossa postura no campo do cuidado da dependência química... Temos sido derrotados; nossas práticas clínicas e sociais no cuidado  pouco conseguem...
Cabe primeiro desdiabolizar e descriminalizar o que é na vida dor, sofrimento... Não cuidamos, nem reabilitamos, se nosso olhar é de quem vê no dependente químico um fracassado, um marginal, um ser que nega a vida e deseja a morte...
Frei Beto afirma que ninguém suporta a normalidade...
Rotelli diz que as drogas são amplificadores da consciência e Deleuze, que são experimentações vitais... e todos concordam que são vivências e experimentações perigosas  por trazerem o perigo de conterem em si uma proximidade experencial e componentes da própria química das drogas que as situam nas margens do abismo. O abismo da repetição compulsiva, do abismo-buraco negro - esvaziamento se sentido da vida e do mundo...
Ambos, já assinalavam um equívoca das nossas intervenções: Deleuze afirma que a subjetiva mudou... e que não funcionamos centrados no afetivo e no mnésico; o psiquismo hoje é agenciado primordialmente pela percepções e nestas um grande valor nas micro-percepções... Rotelli - claramente - grita que necessitamos ser mais sedutores do que o mundo das trocas...
O grande erro é que buscamos, muitas vezes, no cuidado, clínico e social, que as drogas sejam abandonadas e substituídas pelo nosso mundo triste, cinzento, solitário, de desamor e violência... Temos que humildemente buscar Dionísio... para que ele nos auxilie a construir cuidados e políticas públicas onde possamos oferecer caminhos de vida - alegria e sonhos...
Ouso a dizer que pedimos aos nossos jovens que se cuidem.. que abandonem numa árdua luta o inferno da overdose e venha viver a overdose do nosso inferno. Queremos cuidar, mas na luta contra morte vamos descobrindo que oferecemos em troca uma outra morte, a nossa morte da vida cinzenta... Busquemos na alegria a potência da vida para que a vida seja a nossa interlocutora ante os perigos e avanços da maldita morte.
Embora, brevemente, acrescentarei aqui... compreensões necessárias na superação da dor da dependência química...
Freud afirma que a passagem da infância para a vida de adulto passa por um movimento interno de rebeldia onde se mata o pai interno, para que a pessoa assuma o auto-governo de si mesmo... O que nos diz diretamente que indignação, rebeldia e insurgência são canais de entrada no mundo das trocas; porém, igualmente, podem ser manuseados como vias asfaltadas para o grande livramento, para a saída.
Os lacanianos nos auxiliam dizendo que a dependência é mais grave e voraz nos psiquismos, subjetividades que funcionam mobilizados pelo desejo do prazer oceânico, com limites da capacidade de suportar frustrações... Assim, há que se reinventar a subjetividade cunhar gradativamente os mecanismos de auto-controle, de continência na convivência com dores, limitações e derrotas... Precisamos assumir o vida de humanidade que é paradoxal: alegria e dor, amor e rejeição, paciência e cólera, vitórias e derrotas...
Ainda acrescento o texto de Deleuze: A porcelana e o vulcão...
As drogas nos põe numa velocidade e intensidade que se não criamos linhas de vida para dar consistência e voar sobre os abismos, já que tal velocidade e intensidade, nos coloca na fronteira entre a vida, o abismo e para além do abismo, linhas de vida nova, esta energia volta-se e tatua nosso corpo com um destino de morte... a fissura.
O que nos sugere um retorno a Frei Beto.. que dizia que se livrar da dependência era necessário um,a causa, uma paixão, um projeto novo, inovador para vida. Uma causa política, existencial, espiritual, amorosa, artística, uma militância pela vida na alegria de um sonho...
Busquemos o que pode a ternura, a alegria, o amor... cuidemos, nunca nos esquecendo que cuidar é incluir... e incluir a diferença nos obriga a ver nossa vida e nossos caminhos abertos ao devir.

Concurso para psicólogos: CORPO DE BOMBEIROS DE MG

http://www.bombeiros.mg.gov.br/component/content/article/17-noticias/12266-corpo-de-bombeiros-abre-inscricoes-para-83-vagas-de-nivel-medio-e-superior-em-mg.html

O INACEITÁVEL RETROCESSO

http://www.cartacapital.com.br/saude/inaceitavel-retrocesso-no-tratamento-de-dependencia-de-drogas#.TkaraZRNsJA.facebook
Pertencer

Um amigo meu, médico, assegurou-me que desde o berço a criança sente o ambiente, a criança quer: nela o ser humano, no berço mesmo, já começou.
Tenho certeza de que no berço a minha primeira vontade foi a de pertencer. Por motivos que aqui não importam, eu de algum modo devia estar sentindo que não pertencia a nada e a ninguém. Nasci de graça.
Se no berço experimentei esta fome humana, ela continua a me acompanhar pela vida afora, como se fosse um destino. A ponto de meu coração se contrair de inveja e desejo quando vejo uma freira: ela pertence a Deus.
Exatamente porque é tão forte em mim a fome de me dar a algo ou a alguém, é que me tornei bastante arisca: tenho medo de revelar de quanto preciso e de como sou pobre. Sou, sim. Muito pobre. Só tenho um corpo e uma alma. E preciso de mais do que isso.
Com o tempo, sobretudo os últimos anos, perdi o jeito de ser gente. Não sei mais como se é. E uma espécie toda nova de "solidão de não pertencer" começou a me invadir como heras num muro.
Se meu desejo mais antigo é o de pertencer, por que então nunca fiz parte de clubes ou de associações? Porque não é isso que eu chamo de pertencer. O que eu queria, e não posso, é por exemplo que tudo o que me viesse de bom de dentro de mim eu pudesse dar àquilo que eu pertenço. Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado em papel enfeitado de presente nas mãos - e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, raramente embrulho com papel de presente os meus sentimentos.
Pertencer não vem apenas de ser fraca e precisar unir-se a algo ou a alguém mais forte. Muitas vezes a vontade intensa de pertencer vem em mim de minha própria força - eu quero pertencer para que minha força não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa.
Quase consigo me visualizar no berço, quase consigo reproduzir em mim a vaga e no entanto premente sensação de precisar pertencer. Por motivos que nem minha mãe nem meu pai podiam controlar, eu nasci e fiquei apenas: nascida.
No entanto fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram por eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança.
Mas eu, eu não me perdôo. Quereria que simplesmente se tivesse feito um milagre: eu nascer e curar minha mãe. Então, sim: eu teria pertencido a meu pai e a minha mãe. Eu nem podia confiar a alguém essa espécie de solidão de não pertencer porque, como desertor, eu tinha o segredo da fuga que por vergonha não podia ser conhecido.
A vida me fez de vez em quando pertencer, como se fosse para me dar a medida do que eu perco não pertencendo. E então eu soube: pertencer é viver. Experimentei-o com a sede de quem está no deserto e bebe sôfrego os últimos goles de água de um cantil. E depois a sede volta e é no deserto mesmo que caminho!
Clarice Lispector

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Psicologia: um compromisso social


A Psicologia, antes de se tornar profissão regulamentada, era exercida principalmente por médicos, filósofos e educadores. A Psicologia não está pronta, não esteve sempre na sociedade como um conhecimento necessário; ela se desenvolveu como profissão, conforme a vida social foi exigindo esse tipo de saber e fazer.

Como profissão, a Psicologia veio colaborar com o processo de modernização da sociedade brasileira nas escolas e empresas; adaptar as pessoas, selecionar, categorizar, colocar o homem certo no lugar certo.

Como prática e conhecimento, no princípio, o saber psicológico servia aos interesses da elite, que era quem tinha possibilidade de reconhecê-lo e introduzi-lo.

Com o golpe militar, a relação da Psicologia com a sociedade foi impedida pelo regime de 64. Logo, o Ministério da Educação, mudou o currículo dos cursos instituindo a Psicologia Comunitária. O objetivo era desenvolver técnicas que possibilitassem a penetração em diversos grupos da sociedade, com o intuito de seduzi-los para os interesses do Estado. Rejeitou-se o projeto do governo por ser um instrumento de manipulação de massas.

O fato de a Psicologia brasileira ter nascido sob a ditadura militar, a falta de democracia social, as lutas ocultas nos partidos, nas várias formas de artes e nas academias, talvez tenha formado um bom terreno para que os psicólogos escapassem de um projeto corporativista mesquinho que os mantivesse aliados à elite.

A situação era propícia para o desenvolvimento de um projeto de compromisso social da Psicologia.

[...] Os psicólogos viraram as costas para a realidade social, acreditando poder entender o fenômeno psicológico a partir dele mesmo:as crianças não aprendem na escola porque não se esforçam ou porque têm pais que bebem e mães ausentes; as mães pobres não tratam adequadamente seus filhos porque não conhecem os saberes da Psicologia; as pessoas não melhoram de vida porque não querem; os trabalhadores perdem suas mãos nas máquinas devido à pulsões de morte ou coisa que o valha. Os jovens matam crianças com tiros porque têm natureza violenta ou porque seus pais...(BOCK, 2008).

A Psicologia Comunitária ajuda a entender que, para se compreender o comportamento humano, é necessário ir além do que ocorre no indivíduo isolado, estudando o meio onde ele vive, sua família, comunidade e suas complexas interações sociais, levando em consideração a natureza física, psíquica e social e o entorno econômico, político, histórico e cultural desse sujeito.

É que o humano vai sendo constituído ao longo de sua vida conforme vai coletivamente produzindo suas sobrevivências e sua vida social.

A partir do século XXI, a Psicologia começou a estabelecer uma nova relação com a sociedade. Surge a demanda de referências técnicas para novas práticas profissionais voltadas para as políticas públicas, para um compromisso com a maioria da população e suas urgências, para os desafios da sociedade moderna e para os Direitos Humanos.

Nessa sociedade consumista a tendência é acabar com a faculdade de imaginar do sujeito. Com a homogeneização e normatização dos comportamentos houve um afastamento dos indivíduos em relação às suas próprias questões, tanto de seu campo pessoal quanto de seu campo social. E como sujeito linear, esse homem, sempre ocupado, tem de ser produtivo e estar sempre apto a consumir e a dar respostas. Na velocidade da labuta diária falta às pessoas espaço para criar, fruir, pensar, descansar, contemplar, sentir e refletir.

É urgente que a Psicologia fique atenta ao mal-estar instalado na sociedade contemporânea que precisa ser escutado. Como ciência e profissão, ela está presente no dia a dia da luta por um mundo melhor, no resgate da subjetividade, intervindo em grupos coletivos no sentido de liberar os desejos, as singularizações e os campos de produção de novos territórios existenciais.

Cada vez mais é preciso enfrentar novos desafios teóricos e práticos; romper com tradições, superar velhas concepções e pensar uma Psicologia acessível a todos.

A prática dos nossos psicólogos tem de se adaptar às demandas da realidade social brasileira, contribuindo para a evidência e superação das duras desigualdades sociais do país. Há que se evidenciar para que a sociedade e o poder público “enxerguem” e incrementem ações mais eficazes. Essa prática diferenciada dos profissionais exige esforço, reflexão crítica constante e posicionamento para além da competência técnica.

Que, como psicólogos, tenhamos sempre: discernimento para avaliar o que sentimos, responsabilidade para rever o que fazemos, humildade para reconhecer que não sabemos tudo, e, sobretudo, flexibilidade e criatividade para reformular.

Que sejamos capazes de exercer a Psicologia a serviço da sociedade, a serviço de um mundo melhor, de condições de vida digna, de respeito aos direitos humanos e da construção de políticas públicas que possam oferecer práticas psicológicas sintonizadas com as demandas do nosso tempo.

Angela Maria Amâncio de Ávila

Psicóloga- CRP-04/2683

Texto publicado na coluna PSICOLOGIA do JORNAL O PLANALTO

ALGUNS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CÓDIGO DE ÉTICA DOS PSICÓLOGOS



I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

III. O psicólogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política,

econômica, social e cultural.

IV. O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo aprimoramento profissional, contribuindo para o desenvolvimento da Psicologia como campo científico de conhecimento e de prática.

V. O psicólogo contribuirá para promover a universalização do acesso da população às informações, ao conhecimento da ciência psicológica, aos serviços e aos padrões éticos da profissão.

Art. 2º – Ao psicólogo é vedado:

a) Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão;

b) Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais;

d) Acumpliciar-se com pessoas ou organizações que exerçam ou favoreçam o exercício ilegal da profissão de psicólogo ou de qualquer outra atividade profissional;

e) Ser conivente com erros, faltas éticas, violação de direitos, crimes ou contravenções penais prati­cados por psicólogos na prestação de serviços profissionais;

f) Prestar serviços ou vincular o título de psicólogo a serviços de atendimento psicológico cujos procedimentos, técnicas e meios não estejam re­gu­lamentados ou reconhecidos pela profissão;

VI. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado com dignidade, rejeitando situações em que a

Psicologia esteja sendo aviltada.

VII. O psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em que atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades profissionais, posicionando-se de forma crítica e em consonância com os demais princípios deste Código.

Art. 3º - O psicólogo, para ingressar, associar-se ou permanecer em uma organização, considerará a missão, a filosofia, as políticas, as normas e as práticas nela vigentes e sua compatibilidade com os princípios e regras deste Código.

Parágrafo único - Existindo incompatibilidade, cabe ao psicólogo recusar-se a prestar serviços e, se pertinente, apresentar denúncia ao órgão competente.

Art. 9º - É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.

Art. 13º - No atendimento à criança, ao adolescente ou ao interdito, deve ser comunicado aos res­ponsáveis o estritamente essencial para se promoverem medidas em seu benefício.

Art. 14º - A utilização de quaisquer meios de re­gis­tro e observação da prática psicológica obedecerá às normas deste Código e a legislação profissional vigente, devendo o usuário ou beneficiá­rio, desde o início, ser informado.

Art. 15º - Em caso de interrupção do trabalho do psicólogo, por quaisquer motivos, ele deverá ze­lar pelo destino dos seus arquivos confidenciais.

§ 1º - Em caso de demissão ou exoneração, o psicólogo deverá repassar todo o material ao psi­có­­logo que vier a substituí-lo, ou lacrá-lo para pos­terior utilização pelo psicólogo substituto.

§ 2º - Em caso de extinção do serviço de Psi­co­logia, o psicólogo responsável informará ao Con­se­lho Regional de Psicologia, que providenciará a destinação dos arquivos confidenciais.

Caso o cidadão tenha dúvidas quanto à postura do psicólogo ou entenda que o profissional tenha cometido alguma falta ética, pode entrar em contato com:

· Conselho Regional de Psicologia: Fone: (31) 2138-6775 (Belo Horizonte) Rua Timbiras, 1532, 6º andar, Lourdes – BH Email: etec@crp04.org.br

· Escritório Setorial Triângulo: Técnica: Marcela/Telefone: (34) 3235-6766 (Uberlândia)
Av. Floriano Peixoto, 615 salas 302 e 303 - Centro - CEP 38412-112 Email:
uberlandia@crp04.org.br

Conheça o Código de Ética na íntegra e outras legislações nos sites: Conselho Federal de Psicologia: www.pol.org.br ou Conselho Regional de Psicologia: www.crpmg.org.br

___________________________________________________________________________________________________

Psicoterapia


Angela Maria Amâncio de Ávila-CRP-04/2683

Psicoterapia é uma das práticas clínicas do psicólogo muito “benvinda numa sociedade marcada por alta vulnerabilidade subjetiva, cujo cotidiano é perpassado pela lógica de consumo, pelo individualismo e pela fragilidade dos laços sociais.

Breve, emergencial, focal, de apoio ou de longa duração, as psicoterapias podem ocorrer de forma individual, grupal, familiar, institucional, comunitária, de casal, de crianças, de adolescentes, de adultos, de idosos ou pessoas expostas a problemas semelhantes.

É importante reiterar que a Psicoterapia não é “coisa de maluco”, “falta do que fazer”, “luxo”, “sinal de fraqueza”, “promessa de cura” “solução mágica de problemas”, “advinhação”, “uma droga que cria dependência”, “trabalho, programação ou educação do emocional”, “ensinamento” ou “conselho”.

Cada psicólogo tem uma linha de trabalho: Psicanálise, Cognitivo-comportamental, Gestalt, Existencial- humanista, Sistêmica, Psicodrama,Terapia centrada na pessoa, Analítica Junguiana etc.

Todas as formas de psicoterapias têm o objetivo de diminuir o sofrimento e promover o bem-estar emocional das pessoas. A psicanálise, por exemplo, procura a causa do sintoma para transformá-lo. No entanto, algumas pessoas procuram uma psicoterapia simplesmente com o objetivo de se conhecerem melhor.

Em alguns casos, como em quadros de depressão, ansiedade, na psicose ou outros, a psicoterapia é complementar ao tratamento medicamentoso. Além da terapia e dos medicamentos, existe um terceiro elemento fundamental: a postura médica.

Freud (1905[1904]), o pai da Psicanálise, já afirmava que “os médicos sabem que as doenças não são curadas apenas pelo medicamento, mas também pela personalidade do médico, ou seja, pelo exercício de sua influência psíquica”.

Para ser psicoterapeuta, o psicólogo precisa ter concluído um curso universitário de cinco anos de Psicologia, ter sólida formação em Psicologia Clínica, estar inscrito no seu Conselho Regional de Psicologia e adimplente com as obrigações contratuais em vigor. Além disso, o psicoterapeuta, para oferecer um trabalho de qualidade, precisa se submeter a uma psicoterapia pessoal, ter um bom supervisor de trabalho e fazer reciclagens constantes.

A psicoterapia só funciona se houver demanda do cliente; do contrário, sob encomenda, o processo psicoterápico não ocorre.

Muito diferente do que pensa a maioria das pessoas, na psicoterapia não há como acelerar: cada cliente tem um tempo e um ritmo, e seu discurso não precisa ter sequência, tempo ou lógica.

O psicoterapeuta tem linha e estilo pessoais de trabalho, o que não pode perder de vista é o seu referencial teórico e a ética. Esse profissional, com sua sensibilidade, flexibilidade e criatividade deve utilizar somente métodos e técnicas cientificamente comprovados e reconhecidos pela Psicologia.

O psicoterapeuta é um escutador à espera da palavra, um investigador permanente que só intervém quando necessário. Escutador do sofrimento, conflito ou problemas psicológicos de base sociais e culturais. Alguém que, sem suposto saber, que garante o sigilo e vai acompanhando passo a passo o ritmo, o tempo interno e a capacidade de absorção de cada cliente, para que ele se desvende, se auto-conheça, pense sobre si mesmo e sobre o mundo através de suas relações interpessoais, familiares, amorosas, sociais e de trabalho.

Cada cliente é levado a se responsabilizar por sua singularidade, a encarar seus temores, seus conflitos, suas dificuldades, suas inibições, suas culpas, seus sintomas e suas angústias; a lidar com suas perdas, suas limitações ou a suportar o que não é possível mudar e a ampliar e construir recursos para o enfrentamento das demandas do cotidiano.

A Psicoterapia, em alguns momentos, traz sofrimento e inquietações para o cliente, na revivência de sentimentos e emoções primitivas no contexto construtivo da relação terapêutica. Não há outra forma de se desvencilhar das questões emocionais a não ser vivenciando-as e atravessando-as.

Para ser encerrada a psicoterapia, o cliente precisa ser avisado com antecedência, a fim de que haja tempo para o desligamento do vínculo emocional estabelecido com o psicoterapeuta.

Psicoterapia: a população tem o direito de usufruir essa ferramenta com um profissional qualificado que tenha um diálogo com os aspectos éticos, políticos, sociais, culturais, históricos do cliente e com a transdisciplinaridade.


CONVITE - REUNIÃO DA APA


Boa noite, colegas.
Lembrando nossa reunião mensal dia 10/05 às 20 hs no consultório da Sheila, na rua Calimério Guimarães, em frente ao banco panamericano .
Contamos com a presença de todos e solicitamos as contribuições para o Regimento Interno por email para construirmos nossas propostas.

Abraços, e até lá!!!
--
Associação dos Psicólogos de Araxá
Blog: associacaodospsicologosdearaxa.blogspot.com
E-mail: asspsi@gmail.com

sábado, 9 de abril de 2011

Carta a um drogado - Rubem Alves


De todas os pássaros, os beija-flores são os que mais me fascinam. Suas cores brilhantes: verde, azul, preto. Nunca vi mas sei que alguns têm cores vermelhas. Flutuam no espaço como nenhum outro pássaro, suas asas batendo com uma velocidade tal que as torna invisíveis. E a velocidade do seu vôo: pairam no ar, imóveis, sugando a flor. De repente transformam-se em flechas que disparam pelo ar. Vivem do mel das flores. Enfiam seu bico fálico no orifício vaginal das flores, suas pequenas línguas saem e sugam o néctar doce.

Foi assim a primeira vez: como o beijo manso e inofensivo de um beija-flor. Você sentiu sua língua doce entrando no seu corpo. De repente tudo ficou colorido, brilhante, leve. Alegre. Como se você estivesse sendo tocado pelos deuses. Que bom se a vida fosse sempre assim!

O beija-flor se foi e sua vida voltou ao que era, o cotidiano de sempre que lhe parecia bobo e sem sentido. A vida ficava muito mais bonita com o beijo do beija-flor! O beija-flor voltou. Você ficou alegre. A experiência se repetiu. Você pediu que ele lhe enfiasse seu fino bico como da primeira vez. Esses beija-flores sempre obedecem. Você não percebeu que a lingüinha do beija-flor estava um pouquinho maior, entrava mais fundo em você. Mas, que importância tinha isso diante da alegria que o beija-flor lhe trazia?

Aí o beija-flor se transformou no seu pássaro encantado. Você pensava nele durante a sua ausência e sua vida passou a ser uma espera do seu retorno.

Cada vez que ele voltava sua língua ficava um pouco maior. Ia mais fundo. Dividiu-se em várias. Passou a entrar em muitas direções do seu corpo e da sua alma ao mesmo tempo. O beija-flor já não era o passarinho inofensivo do primeiro dia. Cresceu. Você percebeu que havia garras nos seus pés. E havia anzóis em suas línguas. Você começou a querer livrar-se dele. Mas ele já havia cavado buracos profundos no seu corpo e na sua alma. Na ausência do beija-flor esses buracos doíam com uma dor insuportável. Mas ele sempre voltava - tão diferente! - e fazia a dor passar. Agora o que o ligava ao beija-flor não mais era o prazer do primeiro dia. Era o prazer (tolo) de ver a dor passar.

A mitologia Grega conta de um herói, Prometeu. Prometeu desafiou os deuses, roubou o fogo e deu-o aos homens. Como castigo ele foi acorrentado numa rocha e um abutre vinha diariamente comer um pedaço do seu fígado.

Prometeu é você. O beija-flor o enganou. Disse-lhe que era possível ter a felicidade dos deuses sem fazer esforço: bastava aceitar o seu beijo. Você - menino bobão - acreditou. Agora você está acorrentado num rochedo. Você já notou que o beija-flor deixou de ser um beija-flor? Que ele se transformou num abutre? Vá diante de um espelho. Olhe-se com atenção. Veja a que lixo você foi reduzido!

O caminho em que você está tem apenas três fins possíveis.

O primeiro deles, o melhor, o que tem menos sofrimento, é a morte.

Ah! Ellis Regina! Você cantava tão bonito! Alegria para tanta gente! Mas as alegrias comuns da vida não lhe bastaram! Você queria alegrias maiores! Afinal de contas, os artistas bem que a merecem! Não sei se foi acidente ou se foi de propósito. O fato é que o beija-flor a matou.

Ah! Chet Baker! Você não sabe quem é Chet Baker? Aconselho-o a ir a uma loja de CDs e procurar por ele. Você vai ouvir o pistão mais veludo, mais suave, mais triste, mais bonito que você já ouviu. Que felicidade poder tocar pistão daquele jeito! Que felicidade ser amado do jeito como ele era, pela música que ele fazia. Mas ele não suportou as exigências do beija-flor que já havia se apossado do seu corpo. Incapaz de quebrar as correntes, ele achou que o único caminho era morrer. Somente a morte colocaria um fim ao seu sofrimento. A morte, freqüentemente, é a única saída.

O outro caminho é a loucura. O seu ‘hardware’ e o seu ‘software’ não agüentam a luta e você enlouquece. Será que há situações em que a pessoa deseja ficar louca? Sei que há situações em que a gente deseja ficar doente. Doente, a gente deixa de ter responsabilidades. Os outros cuidam da gente. Se você ficar louco não adianta o beija-flor vir. Os outros não vão deixar que ele entre. Dói muito a princípio. Se você não estivesse louco você deixaria que o abutre comesse mais um pedaço do seu fígado. Mas você está louco. Os médicos e enfermeiros o defendem.

O último caminho, eu acho, é o mais terrível. Por causa do beija-flor-abutre você é capaz de fazer qualquer coisa. E você vai entrando cada vez mais fundo num mundo sinistro e escuro do qual é muito difícil sair. Até que você comete um crime que o levará à prisão. Aí você passará a sua vida atrás das grades, no meio de criminosos cruéis - e você nem imagina a que humilhações você será submetido.

Essa carta, eu a escrevo admitindo a hipótese de que você queira quebrar as correntes. Se você não quer nem precisa continuar a ler. Será uma perda de tempo.

Há uma coisa que recebe o nome de ‘síndrome de abstinência’: ela é a dor que se sente na ausência do beija-flor-abutre. É dor física, é ansiedade, é angústia, é pânico, é desespero - tudo junto. Para se livrar dessa dor você será capaz de fazer qualquer coisa: você perde a razão. Aí, para que você não faça essa ‘qualquer coisa’, pessoas que o amam - se é que elas existem - tomam uma providência: internam você numa clínica. Internação em clínica é um artifício de força a que se recorre para impedir que você faça a tal ‘qualquer coisa’, na esperança de que, depois de muito sofrimento, a dor vá passando e as correntes fiquem mais fracas. De fato, com o tempo, as dores passam. Como passam também as dores que se tem quando uma pessoa querida morre. Com uma diferença: quem sofre a perda de uma pessoa amada sabe que não há nada que se possa fazer para que ela volte. Então, ela nem tenta. Convive com a sua dor. Não há outra alternativa.

Mas esse não é o seu caso. O buraco parou de doer. Mas ele continua lá. Continuam as memórias das experiências divinas. E as memórias tentam. Ah! Como tentam! E você diz: ‘Já estou livre! Só uma vez! Só uma última vez, vez de despedida. Não haverá outra...’

Jesus era sábio. Conhecia as armadilhas da alma. Contou uma parábola, a estória de uma casa onde morava um demônio. Aí o dono da casa ficou cheio com o demônio e o pôs para fora. Vazia a casa, ele a varreu, pintou e decorou. Mas ficou vazia. Passados uns dias o tal demônio, vagando pelas redondezas, passou pela casa onde morara e se surpreendeu: ‘Vazia! Ainda não tem morador!’ Foi, chamou outros sete demônios e se alojaram na casa. Jesus termina a parábola dizendo que o estado da casa ficou então pior do que era antes. Os demônios moram no Vazio.

Passadas as dores da ‘síndrome de abstinência’ o seu maior inimigo será o Vazio. Como diziam os filósofos antigos, a natureza não suporta o vazio. O vácuo ‘chupa’ o que está ao seu redor. Com o que concordam os que conhecem a alma: o Vazio é o lugar preferido dos demônios. Esta é a razão por que os místicos iam para o deserto, onde não havia ninguém. Não para ter paz. Mas para medir forças com os demônios. ‘E Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto para ser testado pelo demônio.’

Agora, que você está livre da ‘síndrome de abstinência’, trate de encher o seu Vazio. Se você não o encher os demônios voltarão.

Pra lidar com o Vazio nada melhor que trabalho corporal, braçal. As atividades intelectuais e espirituais, que eu tanto amo, podem ser perigosas. Leitura, poesia, meditação, são remédios fracos. Fracos porque eles são vizinhos do mundo do beija-flor. Atividades intelectuais e espirituais freqüentemente têm efeitos parecidos com os das drogas. Marx estava certo quando comparou a religião ao ópio. Freud estava certo quando se referiu ao poder inebriante da música. Inebriante: que nos torna ébrios...

Aconselho que você se empregue numa oficina mecânica, numa construtora, como auxiliar de pedreiro, numa madeireira, numa carpintaria, como agricultor, como jardineiro, como enfermeiro, como lixeiro. Será inútil que você se dedique aos seus próprios hobbies. Você precisa de alguém, ligado aos trabalhos corporais, que saiba da sua situação, e que o aceite como aprendiz.

E é preciso não estar sozinho. Batalha que se batalha sozinho é batalha perdida. Batalha que se batalha com outros é batalha que pode ser ganha. Os AA sabem disso. Os Vigilantes do Peso sabem disso.

A vida, com todas as suas limitações e frustrações, merece ser vivida. Às margens do caminho esburacado há morangos que podem ser colhidos e comidos. Trate de viver. Trate de comer os morangos. Esforce-se por ser feliz! (Correio Popular, Caderno C, 14/01/2001)